Eremitério

Sobre Deus e o que ele fez de nós

As vezes acho que Deus existe. Mas ele não impõe nem orienta nenhuma moralidade, apenas nos fez do jeito que fez. Livres e mortais. Nos fez livres, capazes de subverter qualquer que seja nossa natureza. Nos fez mortais, mas capazes de transmitir adiante tudo, menos a nós mesmos. Podemos ter filhos para transmitir nossa genética. Podemos ter ideias. Podemos escrever poesias. Somos os únicos seres mortais que conseguem passar adiante os medos, as angústias, as felicidades, as visões de mundo... E fazemos isso se quisermos. Até nossa vida, vivemos se quisermos. Somos individualmente livres, mas socializados. Temos que harmonizar nossa liberdade com a dos outros, os que já foram, os que estão conosco, e os que virão. Mas somos mortais. Quando morrermos, tudo o que nós somos desaparecerá, e tudo o que permanecerá será o que de nós ficou nos outros. Com os outros. E eles decidirão, com todas as contigências da vida, o que, agora deles, ficará. Não acho que Deus reservou um lugar especial para imortais. Acho que todos são completamente mortais, inteiramente mortais, de corpo e alma. Ele nos fez para viver uma vida livre, mas uma única vida, e que acabará. Qualquer regra que criamos, é regra nossa. Qualquer preceito moral é invenção nossa. Podemos escolher viver conforme o que quer que seja, no fim, tudo dá em nada. Isso não implica nem em bondade nem em maldade, apenas em indiferença do criador por nós. Ele criou tudo, e decidiu que sua criação incluiria seres perfeitamente livres. De imortal, já basta ele.

Dito isso, continuo ateu.

PS: Texto escrito em 21/11/2024